Da solidão ao sol de saída.

A solidão é o eco do sussurro da alma. A companhia da própria respiração se confunde com o som das folhas das árvores da casa sete. Eu respiro as entrelinhas da moça que costuma habitar esse canto e agora não está. Tento ouvir o som que sai de mim. Há sim um som que salta acanhado dos meus poros e quer confessar-me algo.
A essa manhã, o despertador foi, então, essa música que arranhava minha pele e subia ao meu ouvido.
Acordei com a música do meu corpo e do meu próprio eco.
Folhas, pássaros e borboletas nem repararam a ansiedade dos meus olhos. Eles juravam que morava ali há anos e cantaram para mim como se fôssemos amigos. Tons sopranos de sabiás, cores amarelas das asas de borboletas e a melodia de folhas a cair sobre o telhado, como se já estivesse chovendo.
Abri as portas para receber o sol. Aproveitei a companhia dele e comi os pedaços de maçã sentada à rede. Conheço a textura e sabor da fruta de olhos fechados, porém hoje tudo parecia diferente. Talvez o sol e a solidão tenham adocicado a poesia dessa refeição. Sol ida, só ida.
De saída, vesti a saia e a blusa, e parti de casa como uma criança a cabular as aulas do colégio. Conversava com meus pensamentos ao dirigir o carro à tentativa de despistar o tal incessante sussurro que o âmago fazia nos meus ouvidos de areia. Caminhei sobre pedras e mergulhei no mar cristalino. Tons verdes da água acariciaram o veludo dos meus pensamentos. A imensidão do oceano minimizava minhas angústias.
Sentei às pedras quentes e úmidas e decidi contar ao mar: " hoje acordei aqui sozinha e desfrutei da maçã junto ao sol..."
Ele ouviu meu longo discurso sobre o que eu tinha vivido e preocupo-me em viver futuramente e logo atirou meus versos junto aos grãos de areia, tão pequenos e frágeis.
Eu, ingênua, fiquei em dúvida se aquilo era uma indireta. "Oceano, quer dizer que meus sonhos e medos são grãos?"
Ele era esnobe e encarava minha face queimada.

No dia seguinte, vesti meus pertences da noite e fui ao mar à luz da lua. Por instantes, nadei sozinha ao som da água irritada pelo vento noturno. Sozinha num silêncio sepulcral. O silêncio do oceano namorando a lua.
Parava no meio do mar e movimentava o corpo para manter o equilíbrio. Parava no meio do mar e ouvia a voz de Deus. De fato, uma conversa com Deus. O mar molhou meus pensamentos e respondeu à minha pergunta de ontem.
Sonhos, medos, angústias são grãos.
Grãos do universo.

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