vendedora de frutas

O barulho já se tornou o silêncio da nossa hora mais calma. Tornou-se o som de gotas de água à meia noite. Todos falando ao mesmo tempo e cada vez mais alto. Basta que um chegue e diga belas palavras substituindo o zumbido para que o aplaudam. Não cansa de tudo isso, meu bem? Não cansa de achar a beleza somente no belo? Tanta hipocrisia feita de brindes com copos de vinho tinto.
Vou te contar: empurraram-me até aqui e confesso que não reagi. É certo que ninguém mais me empurra. É certo que estou só com a corda e minhas próprias mãos porém diga-me, bem: como hei de voltar todo esse percurso sozinha? Como hei de achar o ponto exato de onde quero partir? Há tantos que iriam me caracterizar por maus nomes, que iriam achar outros olhos para se dirigirem a mim. Não todos mas muitos. Ainda há aqueles que me dizem para não pensar nos tantos mas dependo destes para ser feliz, compreende?Dependo desse barulho da cidade. Dependo da saia preta e da meia fina. Dependo dos meu cabelos inteiramente castanhos e camuflados. Estamos mergulhados no balde hipócrita. E já é difícil fugir daqui uma vez que para qualquer lugar que eu vá estarei submetida à realidade. Realidade social, econômica e política.
Para que serve esse chão tão consistente, querida? Não posso mais dizer que o amo pois não é a hora de amar, não há tempo o suficiente. Não posso sair de casa sem rumo nem chorar sem apresentar uma sequência absolutamente lógica a fim de justificar o pranto. Não há segundos para sermos gente intocada pela sociedade. Talvez eu esteja dizendo isso a você por não conseguir achar um lugar no sofá, sim. Creio que serei conhecida pela vendendora de frutas gostosas e sementes de girassol no bairro. Não terei dívidas por ser tão persistente como falam. Serei qualquer uma entre tantos doutores que sorrirão ao pagar quatro reais por um quilo de maçãs da minha quitanda.

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